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Cova Medida – os Mortos na luta pela terra no Brasil
Daniel Camargos, Mariana Della Barba, Diego Junqueira, Daniela Penha, Gisele Lobato, Maria Fernanda Ribeiro, Joana Suarez and Pedro Sibahi (Repórter Brasil)
O especial ‘Cova Medida’, da Repórter Brasil, traz um raio-x inédito da violência no campo e revela a impunidade diante dos 31 sem-terra, indígenas e ambientalistas mortos no primeiro ano do governo Bolsonaro. Passado mais de um ano, ninguém foi condenado e apenas um crime foi considerado encerrado.
“A impunidade é um arranjo estrutural no qual as vítimas da violência mantêm sua condição histórica de invisibilidade, mesmo quando eliminadas”, analisa Paulo César Moreira, coordenador da CPT, organização que elabora há mais de três décadas um relatório anual sobre os conflitos no campo.
A invisibilidade à qual Moreira se refere tem relação com o perfil das vítimas. Os executados em 2019 eram majoritariamente homens (93%), moradores de estados da Amazônia Legal (87%), ligados a movimentos sem-terra (35%) ou indígenas que morreram na defesa do território (25%). Trabalhadores pobres, que muitas vezes já viviam sob ameaça e que sonhavam com um pedaço de terra para sobreviver – um direito garantido na Constituição.
Por entre a falta de estrutura das instituições policiais e a morosidade do Judiciário, a impunidade se repete tanto em crimes recentes quanto nos mais antigos: dos 1.496 casos de violência no campo ocorridos entre 1985 e 2018, apenas 120, ou 8%, foram julgados, segundo levantamento da CPT.
“O que faz com que essas pessoas pratiquem crimes é a quase certeza da impunidade”, analisa a ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva, que nasceu em um seringal no Acre e conhece de perto a violência no campo, tendo perdido seu companheiro de militância sindical, Chico Mendes, assassinado em 1988. Mas não só. Para a fundadora do partido Rede, o discurso e algumas medidas adotadas por Jair Bolsonaro, como a redução da fiscalização ambiental, agravam a violência.
A violência no campo e os conflitos de terra estão intimamente ligados à expansão do agronegócio. Isso cria uma demanda por terra, aumentando o seu preço, o que por sua vez é um incentivo para invasores e grileiros tentarem ocupar terras de forma ilegal, e à força. Com a garantia da impunidade, o cadastro autodeclaratório no Cadastro Ambiental Rural, e as promessas inflamatórias do governo, apostam em poder regularizar a terra e vendê-la com lucro. Fazem assim o trabalho sujo, do qual muitas empresas que produzem commodities se beneficiam, ainda que não estejam diretamente envolvidas no processo.
Os mecanismos de proteção existentes atualmente são insuficientes para lidar com as principais causas de ataques e ameaças e focam predominantemente em proteção individual, em vez de focar em garantias coletivas e o reconhecimento do papel dos direitos humanos, do meio ambiente, da terra e do clima.
Instituições financeiras devem apoiar e implementar uma abordagem de tolerância zero a ataques a defensores, na tomada de decisões sobre investimento. Devem exigir que as empresas nas quais investem façam avaliações de devida diligência em direitos humanos para toda a sua cadeia de custódia. Além disso, essas avaliações devem levar em conta o contexto regional e avaliar como o setor em que uma empresa opera, contribui para a violência e a impunidade.
No especial Cova Medida você poderá conhecer a fundo as histórias de trabalhadores sem-terra, indígenas e ambientalistas silenciados pela violência e pela impunidade.
Leia mais sobre o que instituições e empresas podem fazer no site da Iniciativa Tolerância Zero