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BNP Paribas notificado por envolvimento em desmatamento e violações de direitos

Organizações notificam banco francês, BNP Paribas, por seu apoio financeiro a Marfrig, empresa brasileira que está entre os líderes da produção mundial de carne bovina, em razão de seu envolvimento em desmatamento, violações a direitos de comunidades indígenas e trabalho escravo.

DATE, PARIS/BRASILIA—Em uma iniciativa inédita para garantir a responsabilização de atores financeiros em relação ao desmatamento ilegal e graves abusos de direitos humanos ligados à indústria brasileira da carne, a Comissão Pastoral da Terra (CPT), sediada no Brasil, e Notre Affaire à Tous, sediada na França, apoiadas pela Rainforest Action Network, sediada nos EUA,
acabam de notificar o banco francês BNP Paribas por prestar serviços financeiros a frigoríficos, mais especificamente a Marfrig, o segundo maior frigorífico do Brasil. Em notificação enviada a BNP Paribas, as organizações alegam que Marfrig está envolvida em graves violações, por conta da insuficiência da regulamentação de sua cadeia de suprimentos, tendo como efeito sua colaboração de fato com desmatamento, grilagem de terras indígenas e práticas análogas ao trabalho escravo, em fazendas de gado que abastecem suas unidades de processamento de carne. Por fechar os olhos para tais abusos e continuar ajudando a Marfrig a conseguir bilhões de dólares para se financiar, a notificação afirma que BNP Paribas contribui para essas práticas ilegais e pode incorrer em responsabilidade.
Uma investigação do Centro de Análise de Crimes Climáticos (CCCA), realizada sobre dois frigoríficos operados por Marfrig no período de 2009 a 2020, revela que fazendas que têm fornecido carne a Marfrig seriam responsáveis ​​por mais de 120 mil hectares de desmatamento ilegal na floresta amazônica e no cerrado durante este período. Também foi constatado que Marfrig adquiriu gado, direta e indiretamente, de pecuaristas que criavam animais ilegalmente em território indígena. Um levantamento da Repórter Brasil identificou que, entre estes, havia fazendas estabelecidas dentro da Terra Indígena Apyterewa, no estado do Pará – uma das terras indígenas mais desmatadas nos últimos anos.

De acordo com Xavier Plassat, da Campanha nacional da CPT contra o trabalho escravo, “Depois de o governo de Jair Bolsonaro ter interrompido qualquer processo de reconhecimento legal de terras tradicionais, pecuaristas invadem territórios tradicionais, inclusive de povos indígenas, com total impunidade”.

Marfrig também adquiriu gado de fazendas envolvidas em práticas análogas à escravidão, tais como trabalho forçado ou servidão por dívida, rigorosamente proibidas pela lei brasileira.  Entre as pessoas resgatadas de trabalho escravo no Brasil, o setor pecuário representa uma proporção altíssima:  um terço do total liberto entre 1995 e 2022. De acordo com um relatório do Greenpeace divulgado no ano passado, Marfrig não possui procedimentos eficientes para garantir que pecuaristas envolvidos em desmatamento ou em violações de direitos humanos sejam excluídos de sua cadeia de suprimentos. 
Esta é a primeira notificação dirigida a um banco, sob a lei francesa de devida diligencia, para que cumpra com as exigências legais em relação a desmatamento e demais violações de direitos. A lei francesa do Dever de Vigilância exige que as empresas multinacionais que operam na França estabeleçam um plano que "inclua medidas razoáveis ​​de devida diligência para identificar riscos e prevenir graves violações dos direitos humanos e das liberdades fundamentais, da saúde e da segurança das pessoas e do meio ambiente, resultantes das atividades da empresa e das empresas que ela controla”, na França e no exterior. Esta notificação ao BNP é um forte sinal para todos os agentes financeiros, lembrando-lhes de suas obrigações legais em relação à crise climática e a violações de direitos humanos - e dos riscos legais e reputacionais que correm ao não cumprirem imediatamente com tais obrigações.
De acordo com Jérémie Suissa, Diretor de Notre Affaire à Tous: “Já está na hora de os bancos limparem seus ativos. Eles não podem mais fingir que não sabem que seus financiamentos e investimentos estão alimentando ativamente o desmatamento e o caos climático. A lei está do nosso lado, assim como os apelos por justiça climática liderados pelas gerações mais jovens”.